Ferrovia
Fotografia: Denis Belitsky_Shutterstock
Em Portugal, o setor da ferrovia sofreu fortes desinvestimentos a partir do final do século XX, que perduraram nas décadas seguintes. Vários fatores externos, tais como as restrições orçamentais às quais o país esteve sujeito durante e após os anos da troika, levaram a que o problema, já de si preocupante, fosse ainda mais agravado. Em contrapartida, vários países da União Europeia (UE), como a Espanha, fizeram uma aposta inversa, tendo este em particular desenvolvido de forma muito significativa a sua rede de transporte ferroviário, incluindo a de alta-velocidade, inaugurada há mais de 30 anos, decorria o ano de 1992. Assim, a ferrovia em Portugal enfrenta hoje grandes desafios a nível financeiro e tecnológico, mas também traz com ela oportunidades importantes para a indústria nacional e para a diminuição da pegada carbónica associada ao setor dos transportes.
Segundo o documento publicado pela UE em 2019, relativo ao Pacto Ecológico Europeu (PEE), de 1990 a 2018, a UE conseguiu reduzir as suas emissões de gases de efeito estufa em 23%, enquanto registou um crescimento económico de 61%. Contudo, manter esse ritmo resultaria numa redução de apenas 60% das emissões até 2050, o que ficaria aquém da meta estabelecida pelo PEE. Para alcançar a neutralidade climática até esta data, será necessário intensificar os esforços e adotar políticas inovadoras que transformem e modernizem a economia europeia. Um dos setores que poderá dar um grande contributo para alcançar estas metas ambiciosas é precisamente o setor dos transportes, responsável por 25% do total de emissões, sendo superado apenas pelo setor de fornecimento de energia. A necessidade de reduzir drasticamente as emissões coloca, assim, o transporte ferroviário no centro das políticas de mobilidade sustentável.
Com o intuito de catapultar a ferrovia no país, foi lançado em 2022 o Plano Ferroviário Nacional, que visa, de um modo geral, planear a rede ferroviária de passageiros e mercadorias, e a sua interoperabilidade com redes internacionais, a médio e longo prazo, modernizar a atual infraestrutura ferroviária, assegurar uma maior cobertura de todo o território nacional, integrar o transporte ferroviário nas cadeias de logística nacionais e internacionais e assegurar a conexão da rede ferroviária com outros modos de transporte. Naturalmente, estes objetivos de médio e longo prazo só serão possíveis com uma forte capacitação tecnológica nacional, nomeadamente ao nível da engenharia nos diversos ramos abrangidos pelo setor ferroviário.
O presente número temático visa apresentar várias perspetivas, nomeadamente no que diz respeito ao planeamento da rede e das políticas públicas a ela associadas, por parte do Eng. Frederico Francisco, aos grandes investimentos que serão levados a cabo nos próximos anos na ferrovia portuguesa, nomeadamente a nova linha de alta-velocidade entre o Porto e Lisboa, aqui descrita pelo Engº Carlos Fernandes e pela Engª Helena Matos, da Infraestruturas de Portugal, e ainda ao papel do cluster português da ferrovia que abrange vários stakeholders do setor, aqui apresentado pelo diretor da Plataforma Ferroviária Portuguesa Paulo Duarte. Com o intuito de se conseguir um número temático com uma forte abrangência técnica, apresentam-se vários estudos avançados levados a cabo no âmbito da engenharia ferroviária, nomeadamente ao nível da caracterização e desempenho da infraestrutura ferroviária, através de dispositivos móveis de baixo custo, pelos Investigadores do LNEC Dr. Eduardo Fortunato e Dr. André Paixão, da avaliação da condição de pontes através de técnicas de inteligência artificial, pelo Prof. Diogo Ribeiro, do ISEP, e pela Investigadora da FEUP Dr.ª Andreia Meixedo, do desenvolvimento de soluções pré-fabricadas para pontes de alta-velocidade, pelo Eng. José Rui Pinto, e ainda da avaliação do comportamento geotécnico de infraestruturas ferroviárias através de técnicas avançadas relacionadas com a indústria 4.0, por parte do Prof. António Gomes Correia, da UMinho. Por fim, o atual diretor da FEUP e especialista em ferrovia, Prof. Rui Calçada, apresenta uma visão global do atual estado do setor em Portugal e os principais desafios que o país enfrentará nos anos vindouros.
Agradecemos a todos os nossos leitores por se juntarem a nós nesta jornada pelos carris da sustentabilidade e esperamos que esta edição temática não só informe, mas também inspire uma nova valorização do papel vital da ferrovia no combate às mudanças climáticas e no desenvolvimento económico do país.
Em colaboração com Pedro Aires Montenegro, co-editor da Construção Magazine nº122
Diretor da Construção Magazine / Professor na FEUP
Se quiser colocar alguma questão, envie-me um email para info@construcaomagazine.pt
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