Arquitetura ausente: espelho para o reflexo da paisagem

Arquitetura ausente: espelho para o reflexo da paisagem

A piscina da Chamusca da Beira situa-se numa propriedade rural cuja paisagem é delimitada por um muro de pedra e caracterizada pela presença de árvores, numa área de pomar com  árvores ornamentais e de fruto. A sua implantação foi feita de forma a evitar alterações à morfologia original do terreno e a interferir o menos possível com a vegetação existente, mantendo o caráter próprio do pomar e favorecendo o seu enquadramento paisagístico.

A piscina é delimitada por uma plataforma telúrica em granito, agarrada ao solo, que acentua a ligeira pendente do terreno. Num dos topos desta plataforma assenta um volume de construção ligeira contendo as dependências de apoio à piscina: uma copa, uma instalação sanitária, uma área de duche e um espaço de arrumos. Sobre este volume, uma cobertura ligeira em consola, e em tensão com o solo, cria uma zona de sombra sobre o espaço de estar. A sua cor negra faz com que funcione como uma espécie de espelho da própria sombra. Este pequeno pavilhão (volume) é revestido com painéis modulares de aço inox polido que, sendo altamente refletores, permitem a camuflagem do volume na envolvente, desmaterializando a sua presença e prolongando visualmente a paisagem.

O uso de um material refletor na envolvente do volume transforma-o num dispositivo ótico, capaz de espelhar a paisagem, numa tentativa de  dissolver o objeto arquitetónico para, precisamente, ampliar a presença da paisagem em que se inscreve. O objetivo é uma síntese entre a arquitetura e a paisagem, desmaterializando o objeto construído para reforçar a presença da natureza. Construído a partir da ideia de manipulação do olhar, o objeto dissolve os seus limites, submetendo-nos a uma ilusão. A naturalização da arquitetura e a artificialização da natureza constroem um espaço intermédio, esbatendo a fronteira entre figura e fundo.

Por outro lado, este pequeno objeto inscreve, ao longo do ano, as mudanças de estação. Constitui uma arquitetura barómetro que mede, ativando a nossa experiência e consciência do tempo, as mutações dos ciclos da natureza, como refere Julia Schulz-Dornburg em “Arte e Arquitetura: Novas afinidades”. A sua simplicidade formal, a sua ambiguidade traduzida no jogo de simulação da fachada, bem como o exercício de mutismo da paisagem, ao longo do ano, revela de forma paradoxal a condição de instabilidade de uma arquitetura que amplifica tudo o que a rodeia: o prado, as árvores, o tanque de água e o céu.

João Mendes Ribeiro

Membro do Conselho Científico da Construção Magazine / Professor na UC

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