Incêndios pós-sismos: evidências, fatores de risco e medidas de mitigação

FOTO EMAD EL BYED/ UNSPLASH
Historicamente, os incêndios que ocorrem na sequência de grandes sismos têm-se revelado como elementos críticos na amplificação dos impactos iniciais, podendo, em alguns casos, causar danos superiores aos provocados diretamente pela ação sísmica.
Um dos primeiros exemplos documentados é o sismo de Lisboa de 1755. Após o sismo e o tsunami subsequente, deflagraram múltiplos incêndios de grande dimensão, que se prolongaram por vários dias, agravando significativamente a destruição da cidade e aumentando o número de vítimas. Casos mais recentes confirmam esta tendência. O sismo de São Francisco (1906), com magnitude 7,9 Mw, provocou mais de 50 ignições, resultando na destruição de cerca de 28 000 estruturas. No Japão, o sismo de Kanto (1923), também de magnitude 7,9 Mw, originou 277 incêndios, sendo o fogo responsável por cerca de 91m000 mortes. No sismo de Tohoku (2011), registaram-se 348 ignições, muitas associadas à destruição de infraestruturas críticas causada pelo tsunami. Mais recentemente, a 1 de janeiro de 2024, um sismo atingiu a Península de Noto, no Japão. Na cidade de Wajima, um incêndio urbano de grandes proporções destruiu mais de 100 edifícios residenciais e comerciais, após falhas no fornecimento elétrico a cerca de 45 700 famílias na província de Ishikawa.
Com o objetivo de aprofundar o conhecimento sobre este fenómeno, foi desenvolvida uma base de dados com 50 eventos sísmicos que originaram pelo menos uma ignição. Para cada evento, foram recolhidas informações como data, localização, magnitude (Mw), intensidade máxima (segundo a Escala de Mercalli Modificada) e número de ignições. A análise exploratória revelou que não existe uma relação direta entre a magnitude do sismo e o número de ignições. Observam-se sismos de grande magnitude com poucas ignições, e vice-versa. No entanto, entre os eventos com mais de 100 ignições, verifica-se uma predominância de magnitudes elevadas, sugerindo uma correlação parcial, ainda que insuficiente para estabelecer uma relação causal robusta. Relativamente à intensidade sísmica, sismos classificados com intensidade VI não ultrapassaram as 50 ignições, enquanto intensidades superiores tendem a originar um número mais elevado. A dispersão dos dados e o tamanho da amostra limitam, contudo, a robustez estatística destas conclusões, reforçando a necessidade de expandir a base de dados. Foi também analisado o horário de ocorrência dos sismos. Os eventos com maior número de ignições ocorreram sobretudo no início da manhã e durante o período do almoço, o que pode estar relacionado com a maior atividade doméstica nessas faixas horárias, como a preparação de refeições, o uso de eletrodomésticos e sistemas de aquecimento. Esta tendência não se verifica ao final do dia, provavelmente devido ao reduzido número de eventos registados nesse intervalo. Estes dados, embora ainda limitados, evidenciam a complexidade do fenómeno e sublinham a importância de aprofundar o conhecimento sobre os incêndios pós-sismo, de forma a fundamentar estratégias eficazes de mitigação e resposta.(...)
Autor da Coluna Sísmica
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