Profissão: Engenheiro Civil
Durante séculos a criação ligada à construção foi um processo predominantemente anónimo, baseado na tradição e na transmissão da experiência de geração em geração, com evoluções lentas. A revolução industrial trouxe a necessidade de realizar múltiplas grandes obras, em curtos períodos de tempo, nomeadamente as obras públicas.
Nesta transformação, há uma rutura com a tradição e surge a figura do Engenheiro, que domina a ciência e a técnica. Este foi capaz de conceber, modelar e aplicar soluções inovadoras de forma sistemática, otimizando processos e custos, inicialmente, nas obras públicas e, posteriormente, nos edifícios. Foi este o perfil do ENGENHEIRO CIVIL que esteve na génese do surgimento de outros ramos da Engenharia, nos séculos XIX e XX, e que contribuiu de forma relevante para a melhoria da qualidade de vida da sociedade. Entretanto, na maioria dos países, a Arquitetura centrou-se na criação artística, em oposição à criação tecnológica dos Engenheiros.
O espaço natural de atividade, a formação e as competências de um Engenheiro Civil mantiveram-se relativamente estáveis durante o século XX. A profissão participava na definição das estratégias políticas ligadas ao desenvolvimento e obras públicas, concebia e liderava a realização dessas obras, bem como de edifícios, tendo associado um quadro legal e regulador bastante completo.
Contudo, nas últimas décadas, a situação foi-se alterando, paulatinamente. Nos países mais desenvolvidos, a necessidade de grandes obras novas diminuiu, a produtividade e geração de valor no setor AEC desacelerou, as obras, e designadamente os edifícios passaram a exigir contribuições relevantes de outras áreas técnicas, para além da arquitetura. As preocupações ambientais, a eficiência energética e a sustentabilidade ganharam uma relevância legítima que não tinham no passado. Além disso, sob a designação lata de Engenharia Civil, passaram a coexistir diversos perfis de formação, com habilitações e competências distintas, que confundem os menos informados, parecendo que todos estão igualmente habilitados a fazer tudo. O surgimento de ferramentas informáticas de apoio a muitas atividades técnicas ajudou ainda a criar uma falsa noção de simplicidade e a desvalorizar muitos atos técnicos de elevada importância e dificuldade e com enorme impacto na sociedade.
Nem sempre a classe profissional dos Engenheiros Civis e as Escolas de Engenharia souberam reagir a esta evolução atempadamente, fazendo as necessárias transformações, pelo que, atualmente, a profissão tem maior dificuldade em atrair talento jovem. A remuneração e a valorização pela sociedade também regrediram. Posto isto, urge refletir sobre estes assuntos, levando a cabo as alterações necessárias.
Neste número, pretende-se contribuir para essa transformação profissional, refletindo sobre a realidade da profissão de Engenheiro Civil, cruzando-se diferentes perspetivas, desde a formação, competências e atos, atratividade e pontos de vista dos jovens estudantes de Engenharia, mercado atual e futuro, empregabilidade, desafios futuros e interação com outras áreas técnicas.
Em colaboração com Hipólito de Sousa, co-editor da Construção Magazine nº104
Editorial da Construção Magazine nº104 jul/ago 2021, dedicado ao tema 'Profissão: Engenheiro Civil'
Diretor da Construção Magazine / Professor na FEUP
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