Entrevista a Eduardo Cansado Carvalho

Eduardo Cansado Carvalho dá-nos uma perspetiva evolutiva do quadro normativo associado ao projeto e à construção. O projetista explica o que muda com a transposição dos Eurocódigos e aponta caminhos de melhoria.
Entrevista por Cátia Vilaça, Humberto Varum e António Araújo Correia
As normas de suporte ao dimensionamento estrutural têm vindo a evoluir, a par do conhecimento e das ferramentas de apoio ao projeto. Na sua perspetiva, como evoluíram as normas de projeto estrutural em Portugal, nomeadamente no que compara com o panorama internacional?
Para além das regras do Marquês de Pombal para a reconstrução de Lisboa, que deram origem à baixa pombalina, começaram a aparecer, ainda no século XIX, alguns regulamentos que inicialmente tinham a ver quase exclusivamente com as pontes metálicas, cuja tecnologia era avançada para a época. Esses regulamentos tinham a ver com o projeto e construção de pontes metálicas e até de ferroviárias. Logo no início do século XX surge a primeira referência a estruturas de betão armado, e em 1935 apareceu o primeiro regulamento de betão armado. Segue-se uma evolução relativamente lenta. Em 1951 é publicado o Regulamento Geral de Edificações Urbanas (RGEU), que não tinha só a ver com as estruturas, mas tinha referências à parte estrutural, e estava muito vocacionado para edifícios com paredes de alvenaria, com algumas referências aos dimensionamentos das paredes e dos pavimentos de madeira. Finalmente, já nos anos 60, surgem as bases da regulamentação atual, com o Regulamento das Estruturas de Betão Armado e o Regulamento de Estruturas Metálicas para Edifícios, revistos na década de 80 em conjunto com o Regulamento das Ações. No projeto estrutural temos sempre de considerar os dois aspetos do problema: a ação e a resistência. Temos de garantir um projeto em que a resistência é superior à ação a que a estrutura vai ser sujeita.
Ainda na década de 60, foi publicado o RSEP – Regulamento de Solicitações em Edifícios e Pontes, que foi substituído na década de 80 pelo RSA - Regulamento de Segurança e Ações, agora em processo de retirada, que trata da combinação das ações e da sua própria definição.
Em Portugal, conheço melhor a parte da regulamentação relacionada com o betão armado. O regulamento de 1984 foi muito baseado no chamado código modelo, publicado pelo CEB-Comité Europeu do Betão uns anos antes, e foi em grande parte a partir desse documento que se elaborou o Regulamento de Segurança e Ações e o Regulamento de Estruturas de Betão Armado e Pré-esforçado, e em certa medida, também se adaptou o regulamento das estruturas metálicas para esse novo enquadramento, com a correspondente teoria da segurança e das ações. Segue-se um período em que se começou a tratar dos Eurocódigos, uma iniciativa original da Comissão Europeia surgida na década de 80 no sentido de se criar uma regulamentação de projeto estrutural que fosse válida para toda a Europa. Isso começou mesmo antes de Portugal fazer parte da Comunidade Económica Europeia, tendo depois prosseguido. Nos anos 90 houve uma transposição deste trabalho, que originalmente estava a ser feito diretamente sob a égide da Comissão Europeia, para o CEN, o Comité Europeu de Normalização. Nos países do norte da Europa não existem regulamentos obrigatórios do ponto de vista legal. Pelo contrário, em Portugal e nos outros países do sul os regulamentos são leis e assim, como havia estas duas filosofias, o processo passou para o CEN, que publica normas para o projeto de estruturas, às quais os países podem ou não dar força legal, como aconteceu recentemente em Portugal. Esta transposição dos Eurocódigos em Portugal está a ser feita para edifícios de betão armado e de estruturas metálicas, incluindo também os aspetos das fundações, geotecnia e dimensionamento sísmico. Encontramo-nos nesta altura, e até 2022, num período de transição em que é possível aplicar um ou outro quadro regulamentar ao projeto de estruturas.
Do seu ponto de vista, quais são as vantagens de se harmonizar as normas de projeto de estruturas e fundações para o setor da construção a nível nacional e a nível europeu?
A nível nacional não há uma harmonização – os regulamentos portugueses anteriores derivaram de estudos e trabalhos a nível internacional, mas o código modelo não tinha qualquer força legal ou sequer de norma. A nível europeu, um dos principais objetivos da Comissão Europeia ao prosseguir com esta iniciativa de criar os regulamentos é facilitar a livre troca de serviços de projeto entre os vários países. Criando este quadro, um engenheiro finlandês pode fazer projetos em Espanha e um engenheiro português pode fazer projetos em Itália, pelo menos teoricamente, porque depois há outros constrangimentos do ponto de vista do exercício da profissão. (...)
Leia a entrevista completa na Construção Magazine nº101 jan/fev 2021
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