O paradigma de um projeto de arquitetura na área industrial no Século XXI

Um ambiente ruidoso, abafado e sombrio. É esta a ideia que ainda muita gente tem acerca de uma indústria / fábrica. Contudo, este modelo de produção industrial tem vindo a ser desmistificado, tendo em conta uma revolução silenciosa que teve início já no século XIX. Este juízo assume-se de diversas formas, como sustentabilidade, desafios ambientais, tecnologias digitais, etc. Foi este princípio que se quis elevar na Unidade Industrial BRADCO.

A Unidade Industrial BRADCO localiza-se na zona industrial de Felgueiras, concelho de Castelo de Paiva. A empresa encontra a sua génese na área da marroquinaria, contudo, com o decorrer dos anos, também alargou a sua atividade para braceletes. Na área da marroquinaria, fabrica cintos, bolsas, pastas, porta-moedas, carteiras, sapatos, etc. Atualmente, trata-se de uma empresa notória por também trabalhar com marcas de renome.

Pretendeu-se sobretudo, com este projeto o aumento da produção e do número de funcionários, estimulando o emprego e economia da região. O edifício tem dois pisos, tendo estes, na sua globalidade, características diferentes. Resume-se a uma forma pura, retangular, em que, “grosso modo”, toda a zona de produção se desenvolve no centro e as salas, gabinetes e outros espaços necessários ao seu funcionamento se distribuem por três dos seus lados (norte, nascente e sul).

Em toda a zona da produção, destaca-se a sua cobertura (dente de serra), provocando tramos de luz natural, constantes ao longo do dia de forma difusa, sendo que a sua orientação é norte. Desta forma, o espaço de produção deixa de ser um espaço fechado para ser um espaço onde a salubridade delimita o ambiente laboral, tendo em conta uma das questões mais importantes para o ser humano a nível psicológico, nomeadamente para o seu bem-estar, a luz.

E apesar de ser uma luz mais fria, há cada vez mais a preocupação de proporcionar conforto térmico aos funcionários. É, por isso, uma fábrica bem preparada a nível de isolamentos, quer nas fachadas, quer na cobertura. As caixilharias têm características de corte térmico e vidro duplo, bem como um cuidado especial no que concerne à climatização, como por exemplo ar condicionado, extração de ar, etc.

As salas da administração, orientadas a sul, foram projetadas para o lado mais privilegiado da Unidade Industrial, onde se concentra toda a massa paisagística que melhor caracteriza este terreno e território. Por ser a posição mais privilegiada a nível paisagístico, optou-se pela projeção de uma varanda em todo este lado, de forma quer a privilegiar as salas acima referidas e também a proporcionar o seu usufruto aos clientes que ali façam uma visita e queiram ter um pequeno tempo de lazer/estar. Mais uma vez, o conforto foi sempre considerado, quer a nível ergonómico quer a nível paisagístico, sendo que os escritórios administrativos têm sempre acesso visual e físico ao exterior.

Fotografia por Ivo Tavares Studio

Ainda referindo a importância da varanda no edifício e em todo o cenário paisagístico que a envolve, tentou-se, como que num “prolongamento da paisagem”, fazer dois rasgos circulares na respetiva laje, de forma que a vegetação do piso de baixo se estendesse até cima.

A questão sustentável também pesou nesta decisão, pois entendeu-se que, com o decorrer dos anos, duas árvores podem participar de três espaços, em vez de quatro árvores.

Há também uma ligação da varanda através de uma escadaria em pedra até ao piso de baixo. O piso da cave é o piso da entrada principal no edifício. Coabita com dois espaços fundamentais: o hall de entrada e uma das salas de reuniões. Ao contrário do piso de cima, que ocupa toda a forma da implantação (retângulo), este ocupa apenas parte dele, essencialmente por questões morfológicas. A nível solar, coadjuva com o lado sul, nascente e poente.

A varanda também tem um papel preponderante no piso da entrada, ao funcionar como uma “pala” para este espaço. Um espaço de estar, de contemplação da paisagem, de distração, onde permanece um banco maciço em pedra, como se de um marco da paisagem se tratasse. Em torno do mesmo, uma zona verde pontuada por dois ciprestes que se elevam através de dois rasgos circulares comunicando com a varanda e, ao mesmo tempo, presenteando-a com mais dinamismo e diferentes tipos de luz.

Fotografia por Ivo Tavares Studio

Este espaço é primordial para os intervalos dos funcionários, que outrora não podiam desfrutar de um espaço de lazer, quando atualmente é uma questão preponderante quer para a sua motivação quer para o seu desempenho.

Como pedido, desde o início, pelo cliente, não se quis vincular a imagem da Unidade Industrial a um mero “armazém”, mas sim a um marco arquitetónico que representasse a marca da melhor forma possível no concelho. No alçado voltado a norte, que não tem qualquer tipo de abertura já que a entrada principal do edifício se faz pelo lado oposto (sul), optou-se por uma estrutura mais dinâmica e mais representativa da marca BRADCO. Assim sendo, funciona como que uma vitrine para quem ali passar. Recorreu-se também à pedra característica da região (granito) para revestir alguns troços de fachadas.

Mais uma vez, e tirando partido da luz solar, a sustentabilidade também foi contemplada nos painéis fotovoltaicos existentes na cobertura, produzindo, desta forma, energia renovável.

Na indústria, o conceito de ter o cliente como foco permanece e ganha novos alcances, à medida que os produtos são realmente personalizados para necessidades individuais. As fábricas não estarão apenas conectadas entre si, mas também conectadas ao cliente.

Em colaboração com Paulo Rodrigues, arquiteto

Cristina Vaz Santos

Arquiteta

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